O painel do ônibus ameaça cair a cada solavanco: o motorista precisa segurá-lo quando passa por um buraco. O marcador de combustível desapareceu. Só um lado do limpador de para-brisa funciona. Os pneus estão carecas, um farol quebrou, e as portas não fecham direito. Há meses que o elevador para embarque e desembarque de pessoas com deficiência enguiçou. Bancos estão rasgados e pichados. A última vistoria no Detran-RJ foi realizada três anos atrás. Parece improvável, mas se trata de um ônibus usado para o transporte de centenas de passageiros por dia. Circula na linha 850 (Mendanha-Campo Grande), operada pela empresa Pégaso, do consórcio Santa Cruz. É, de fato, um caso extremo, porém simboliza os riscos aos quais os cariocas são expostos no sistema de transporte mais utilizado do Rio.
Como numa crônica de uma tragédia anunciada, os problemas nos ônibus da cidade ganham contornos alarmantes na Zona Oeste, por onde rodam os veículos da Pégaso e da sua filha Auto viação Palmares. São justamente do consórcio Santa Cruz — que atende a bairros como Campo Grande, Bangu, Realengo e Sepetiba — seis das dez piores linhas do Rio, segundo um ranking da Secretaria municipal de Transportes (SMTR) baseado em reclamações registradas de junho a agosto de 2018,o topo desse pódio inglório: 850 (Campo Grande x Mendanha),830 (Campo Grande x Serrinha) 822 (Concundinha-Campo Grande),898 Campo Grande x Sepetiba,833 (Campo Grande x Manguariba),869(Campo Grande x Santa Margarida)842 Campo Grande x Paciência,825 ( Campo Grande x Jesuítas),366 (Campo Grande x Tiradentes),398(Campo Grande x Tiradentes)898 (Campo Grande x Sepetiba) e a 891 (Sepetiba-Mato Alto).
— Os ônibus sempre circulam imundos. É muito comum quebrarem no meio de uma viagem. Ar-condicionado, nem pensar! No verão, viram um forno — queixa-se o metalúrgico Júlio César de Lima, que, na última terça-feira, embarcou num outro veículo da 850, também com licenciamento vencido desde 2014.
ENVELHECIMENTO DA FROTA
A situação reflete um envelhecimento da frota do Rio. Por vários anos, ela reluziu como a mais nova do Brasil. Em 1996, seus veículos tinham uma idade média de 2,52 anos. A partir daí, foi crescendo até 2008, quando atingiu 4,8 anos. Em 2009, voltou a cair, até chegar a um patamar de 3,27 anos em 2011. Depois, subiu de novo, chegando aos atuais 4,8 anos, segundo dados do sindicato das empresas do setor, o Rio Ônibus. Muitos ônibus que andam caindo aos pedaços sequer podem ser considerados velhos — ficam abaixo do limite de oito anos de uso para os veículos comuns de transporte coletivo ou do máximo de seis para os micro-ônibus. Quase sempre, o problema é, realmente, a manutenção.