André Bugrinne, 25 anos, chega ao campo Só 5, no Clube Guanabara, em Botafogo, de terno. A roupa social faz parte do seu dia a dia como estudante de Direito, mas logo depois ele já está uniformizado como um dos jogadores do Bees Cats, time de futebol formado exclusivamente por gays, idealizado pelo roteirista André Machado, 37 anos. A equipe, ao lado do Alligaytors, representa o Rio na Champions Ligay, que será disputada neste sábado, na Rio Sport, na Barra, reunindo mais seis equipes de diferentes cidades do país na luta contra a homofobia.
A Champions Ligay vem para mudar o cenário nacional porque não tem um campeonato brasileiro de futebol gay, não há jogadores gays assumidos no futebol brasileiro. Estamos criando uma coisa que vai ficar para sempre no futebol. Mas nós queremos que daqui a cinco, dez anos, seja normal o jogador se assumir e dizer que é gay e joga em um time grande”, afirma André Bugrinne.
Apaixonado por futebol e torcedor do Flamengo, o estudante diz que nunca sofreu com o preconceito, como outros jogadores do Bees Cats, e afirma que encontrou apoio entre os amigos: “Eu contei para o meu melhor amigo, por exemplo, um dia antes de uma viagem que nós íamos fazer. Estávamos no mesmo carro e eu falei que o meu namorado também estaria. Ele falou: ‘Você é meu amigo, não tem nada a ver'”.
Mas, na família, houve resistência. “Minha mãe já é uma senhora. No começo foi um choque. Ela chorou e eu chorei. Mas hoje em dia ela é muito tranquila comigo”, revela o estudante.
Torcedor do Vasco, o jornalista Flávio Cavalcanti Pinto do Amaral, 26 anos, também nunca se sentiu vítima de preconceito. Mas ouvia casos. “Esse projeto era uma forma de continuar essa ligação com o esporte num ambiente muito mais harmônico. Eu nunca sofri preconceito no meio esportivo, nem no jornalismo, nem jogando bola. Mas a gente vê com quem tem um pouco mais trejeito como é a reação. E se fosse comigo eu também não gostaria”, diz Flávio.
André Machado se inspirou no paulista Unicorns para criar o Bees Cats, em maio. Desde o primeiro encontro, com 15 pessoas, a iniciativa cresceu. “Na quarta ou quinta vez, eram cem pessoas”, conta ele, animado com o convite para a Liga Carioca de futebol soçaite: “São 150 times héteros em oito divisões. A gente entrou na oitava divisão. A receptividade é incrível”.
Bem-humorado, o são-paulino André conta que uma das preocupações era com o uniforme: “Gay quer estar bem vestido. Eu falei: ‘Não quero de peladeiro, parece saco de batata, quero da seleção italiana’. Se você olhar o nosso, é tudo coladinho”.
André diz que o grupo tem regras para jogar: “É proibido reclamar do cara que errou o chute, não pode ter briga, pediu falta parou, não tem discussão.”
A LUTA PARA VENCER O PRECONCEITO
O vôlei e o surfe passaram pela vida do designer gráfico Ralph Teixeira Barbosa, 31 anos, até que a criação do Bees Cats, neste ano, o fez se sentir confortável nos gramados: “Nunca me senti à vontade porque você chega num ambiente em que o que impera para sacanear o adversário é sempre algo relacionado à minha sexualidade, de uma maneira muita pejorativa e pesada.”
Em casa, a aceitação também não foi fácil: “Minha família é bem tradicional. Minha mãe é professora, meu pai é militar, meus tios são advogados, tem um monte de militar na família. Só fui me abrir por força de um relacionamento duradouro.”
Supervisor em uma faculdade, Victor Dubugras, 34 anos, torcedor do Fluminense, também sofreu: “Com um dos meus irmãos, a gente quase caiu na porrada. Brigamos feio, a ponto de ter que correr para a rua, ir à polícia. Hoje ele se arrepende e me trata muito bem. Perdoo porque não era a realidade dele.”