A realidade que muitos cariocas enfrentam diariamente ultrapassou todos os limites. A Clínica da Família Maestro Celestino, localizada em Marechal Hermes, na Zona Norte do Rio de Janeiro, foi fechada por tempo indeterminado devido à falta total de segurança. A unidade, que atendia a comunidade da Palmeirinha, agora está de portas fechadas porque o tráfico de drogas tomou conta da região.
Segundo informações da Prefeitura do Rio, existe um ponto de venda de drogas ao lado da clínica. Homens armados circulam livremente pela área, impondo medo e ameaçando tanto os profissionais quanto os pacientes. O relato de moradores e funcionários é alarmante: traficantes invadiam a unidade, exigiam medicamentos e até mesmo procedimentos médicos, transformando um local de cuidado e esperança em território de intimidação e medo.
“A comunidade da Palmeirinha foi toda cercada pelo tráfico. Há barricadas impedindo o acesso à unidade de saúde. O ponto de venda de drogas funciona colado à clínica, e invasões por homens armados ocorrem frequentemente, constrangendo nossos funcionários e os pacientes. Há uma intenção não declarada dos traficantes de ocupar o prédio”, afirmou o secretário municipal de Saúde, Daniel Soranz.
A gravidade do caso se reflete no destino de centenas de moradores da região, que estão há mais de um mês sem acesso ao atendimento médico na unidade. Eles vêm sendo encaminhados para outras clínicas, muitas vezes distantes, o que agrava ainda mais a situação de quem depende do SUS para consultas, exames e medicamentos.
Mas esse não é um caso isolado. Um levantamento feito pela Secretaria Municipal de Saúde revelou um dado assustador: no primeiro trimestre do ano, clínicas da família e centros municipais de saúde fecharam as portas 853 vezes em 90 dias por conta da violência. Em média, nove unidades de saúde deixaram de atender a população por dia.
A violência obrigou também a redução do horário de funcionamento de uma unidade na Vila Kennedy, na Zona Oeste. O atendimento passou a terminar uma hora mais cedo para evitar riscos aos profissionais e pacientes após o anoitecer.
“O que os números mostram é que a gente vem perdendo território para o tráfico. Profissionais de saúde são protegidos em situações de guerra. Mesmo em países em guerra, essas unidades são respeitadas. Infelizmente, no Rio de Janeiro, isso não está acontecendo”, lamentou o secretário Soranz.
O fechamento da Clínica da Família Maestro Celestino é mais do que um caso de violência urbana. É o retrato de uma cidade onde o Estado perdeu o controle de áreas inteiras, onde bandidos impõem regras e retiram direitos básicos da população. Quando o crime impede o acesso à saúde, é porque o caos já ultrapassou o limite do aceitável.
O Rio de Janeiro, mais uma vez, escancara uma ferida aberta: a normalização da violência e a ausência de políticas eficazes de segurança pública. O grito dos moradores e profissionais da saúde é claro — o Rio não pode continuar assim. Mas, diante de tanta negligência, muitos já se perguntam: será que ainda há salvação?
Enquanto isso, a população segue refém. E a cidade, mais uma vez, sangra.