Policiais que executarem sumariamente criminosos portando fuzis serăo investigados e poderăo ser denunciados por homicídio, ainda que o governador eleito, Wilson Witzel (PSC), autorize o “abate”, alerta o procurador da República Eduardo Benones, coordenador do Controle Externo da Atividade Policial do Ministério Público Federal (MPF) no Rio. Segundo ele, a questăo pode ser levada à Procuradoria Geral da República no ano que vem, uma vez que uma “licença para matar” emitida pelo Estado afrontaria a Constituiçăo e a legislaçăo penal.
“O artigo 121 do Código Penal, que trata de homicídio, está em vigor. Se o Ministério Público năo investigar, baseado no discurso de quem quer que seja, é prevaricaçăo. Năo haverá qualquer tipo de retrocesso ou leniência. Quando chegar o caso concreto, quem vai avaliar năo é o governador, é quem estiver investigando. Năo se pode aproveitar o medo da sociedade e construir e impor uma narrativa”, afirmou Benones em entrevista ao Estado.
O procurador investiga homicídios decorrentes de intervençăo policial e trabalha pelo aprimoramento da atividade policial e pela prevençăo de mortes de policiais e praticadas por eles. Para ele, este tipo de orientaçăo só se sustentaria se houvesse um instrumento jurídico que a amparasse, ou até uma mudança constitucional, uma vez que a Carta considera o direito à vida fundamental. O governador eleito quer posicionar snipers em operaçőes para atuar contra os bandidos com fuzil. Os atiradores receberiam ordens superiores antes de apertar o gatilho.
“As pessoas perderam a capacidade de raciocinar. Os meios năo justificam nem santificam os fins. Neste caso, o meio é questionável e os fins năo estăo claros. Năo há como controlar as consequências para o policial, nem mesmo o sniper. É injusto com o policial. Năo existe licença para matar, isso é só em filme de James Bond”, pontuou. “Ninguém está sugerindo que se deva esperar receber um tiro. Um policial, no ambiente operacional, se ver obrigado a intervir num flagrante é muito diferente de se posicionar atirador de elite”.
Ele ressaltou que a necessidade de se interceptar as armas antes que elas cheguem às măos dos traficantes é que deveria nortear as açőes do Estado. “O discurso do medo muitas vezes leva à interpretaçăo de que se está sendo benevolente com o traficante. A defesa que faço năo é do bandido, é do Estado brasileiro. O absurdo năo é ele estar portando um fuzil, é o Estado năo conseguir interceptar a entrada do fuzil no Rio, pelo mar, terra e ar.”
Para Witzel, policiais que participam de operaçőes contra o tráfico “năo podem ter dúvidas” na hora de atirar, e aqueles que matarem quem portar fuzis năo devem ser responsabilizados “em hipótese alguma”. Como o presidente eleito Jair Bolsonaro (PSL), ele defende a excludente de ilicitude, livrando policiais de consequências criminais. Segundo ele, a autorizaçăo para o “abate” năo aumentará a letalidade violenta no Estado – hoje, em 500 registros por mês, ou 16 assassinatos por dia.
“Năo tem como excluir a ilicitude de antemăo. Isso vale para o policial e para qualquer cidadăo. A legítima defesa tem todo um regramento”, ressaltou o procurador Benones.