O Estado do Rio tem 29 barragens “com potencial para causar danos, em menor ou maior grau, em caso de rompimento, vazamento, infiltração no solo ou mau funcionamento”. A avaliação é do Instituto Estadual do Ambiente (Inea), órgão encarregado de fiscalizar a segurança dessas estruturas. Isso não significa que exista perigo iminente identificado. Duas, no entanto, tiveram classificação de risco considerado alto: a de Juturnaíba e a de Gericinó. A primeira fica em Araruama, cidade com 130 mil habitantes, e abastece de água a Região dos Lagos. Já Gericinó funciona como defesa contra inundações e fica entre Nilópolis e Mesquita — cidades que, juntas, têm 340 mil habitantes.
“Falta funcionário; as gigogas tomaram conta da lagoa e as comportas estão emperradas”, diz o pastor Rogério Martins da Mota, presidente da Associação de Moradores do Bairro Caju e Loteamento Nova Silva Jardim.
Para verificar as condições de segurança de Juturnaíba, o Ministério Público Federal (MPF) em São Pedro da Aldeia convocou visita técnica para quinta-feira, com representantes da Prolagos, Inea, Agência Nacional de Águas (ANA) e Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), além de ambientalistas.
Os órgãos devem informar em 20 dias se estão sendo cumpridas as condições da autorizações de funcionamento, para esclarecer se há riscos e indicando, em caso positivo, as providências. Também foi solicitado que o Movimento Baía Viva apresente, em 20 dias, o detalhamento de riscos.
O Inea, em nota, disse que Gericinó e Juturnaíba estão classificadas com alto Dano Potencial Associado (DPA) pelo porte e importância, mas não esclareceu sobre a classificação da Categoria de Risco (CRI) ser alta.
O professor de Engenharia Geotécnica da Coppe/UFRJ, Maurício Ehrlich, esclarece que uma barragem tem CRI alto quando um problema é provável. “A definição está associada à probabilidade de rotura e danos advindos dessa ruptura. A análise chama atenção para consequências que seriam muito graves”, diz.
A Prolagos, responsável pela operação em Juturnaíba, diz seguir o Manual de Procedimentos para Operação de Barragem aprovado pelo Comitê de Bacias Hidrográficas Lagos São João e que tem laudo de consultorias especializadas — o último de maio de 2018 — atestando como normais as condições estruturais. O laudo técnico está sendo atualizado, por solicitação do Inea feita em dezembro.
Ehrlich alerta que um eventual problema em Juturnaíba poderia provocar a inundação rápida das cidades em volta e o desabastecimento de água na Região dos Lagos. “Um dos problemas da falta de manutenção é a infiltração de água na barragem. É necessário garantir que ela saia de forma que não cause erosão”, explica.
Em relação à barragem de Gericinó, única administrada pelo Inea, o órgão informou que foram feitas vistoria e inspeção de segurança regular em dezembro e não foram detectadas anomalias que impliquem em risco de rompimento da estrutura.
A Secretaria Estadual de Ambiente e Sustentabilidade informou que um grupo multidisciplinar atualizará o diagnóstico das barragens do estado, criará critérios para regulamentar os licenciamentos e garantir o cumprimento da política estadual de segurança de barragens. O prazo do trabalho será de 90 dias, nos quais administradores das barragens serão notificados e vistorias realizadas.
Movimento vai orientar vizinhos de barragem
Para a coordenadora nacional do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), Alexania Rossato, o país precisa criar uma rotina de fiscalização e que seja um processo contínuo. “Deve ser estabelecida uma fiscalização permanente, para que não se precise correr depois contra o tempo e que vidas sejam perdidas”, explica.
Segundo ela, o MAB está realizando um trabalho de alerta sobre as barragens no estado e no país. “Estamos fazendo denúncias e divulgando na imprensa, pois é fundamental que as barragens tenham um monitoramento regular e sistemas de alerta que funcionem”, afirma.
Segundo o também militante do MAB, Leonardo Maggi, o movimento vai trabalhar junto moradores próximos às barragens, inclusive a de Juturnaíba, prioridade no Estado do Rio.
“Para nós é prioridade chegar a esses locais e orientar a população, além de pressionar as empresas a criar mecanismos de prevenção e cuidados”, explica.
Maggi explica que a tragédia de Brumadinho reforça um problema que existe em todo o país. “É uma questão nacional; há em muitas barragens com alto risco. O problema é que, muitas vezes, quem atesta a barragem é a própria empresa. Convivemos com esse absurdo, uma coerência completa, por culpa da nossa falta de capacidade de fiscalizar”, denuncia.