A escritora americana Rebecca Solnit se preparava para deixar aquela festa quando um sujeito importante e rico a abordou. “Não vá ainda, quero conversar com você”. O homem, no entanto, não estava interessado em dialogar, queria fazer um monólogo.
Encostou a escritora contra a parede — coitadinha, ela tinha “tanto a aprender”! — e começou a discursar sobre um livro “muito importante” que ela tinha de ler. A americana tentou falar durante vários minutos, sendo sempre interrompida. Um dos presentes, então, revelou ao homem o tamanho do seu papelão: Rebecca era a autora da obra em questão.
É com esse relato que ela abre seu novo livro, “Os homens explicam tudo pra mim” (Editora Cultrix, 208 págs, R$34). Com a publicação, ela pretende confirmar: a arrogância masculina não é só um defeito, é uma marca do machismo. “A maioria das mulheres luta em duas frentes — uma pelo tópico em questão, qualquer que seja, e outra, simplesmente, pelo direito de falar, de ter ideias, de ser reconhecida como alguém conhecedora de fatos e de verdades, alguém com valor, um ser humano”, argumenta.
Nas discussões feministas, tem-se chamado esse fenômeno de mansplaining (homexplicar). Eu não uso esse nome porque termos do inglês são elitistas e excludentes de mulheres que não falam o idioma. Também não gosto de me deixar colonizar pelo pensamento feminista americano. Não, eu acredito em um movimento igualitário e diverso, que se alimenta, sim, de ideias de outros países, mas adaptando-as à própria realidade. Sugiro falarmos de homexplicar ou, simplesmente, de arrogância masculina.
Isso acontece quando, igual com Rebecca, um homem tira de uma mulher o direito de fala para explicar para ela sobre um assunto que ele não domina, mas ela, sim. Nesses casos, ele devia ter a posição humilde de calar-se e ouvir, aprender em vez de tentar ensinar.
Quantas vezes não passamos por isso no trabalho? Eu mesma já me encontrei com fornecedores de empresas interessadas em me contratar como palestrante de igualdade de gênero que, em reunião, passaram hora e meia me explicando como eu deveria ensinar as pessoas a combater o machismo. O homem não havia dedicado um dia sequer de sua vida àquilo; eu mergulhara na área desde 2009.
Isso ocorre por conta de uma série de estereótipos de gênero, como “mulheres são frágeis, pouco racionais, superficiais” ou “homens são mais inteligentes, sabem mais, têm mais autoridade”. No entanto, toda vez que um homem nos rouba o poder de voz, ele nos tira o papel de sujeito intelectual, de pessoa detentora de conhecimento com direito de compartilhá-lo.
Quer saber que males isso causa ao mundo? Como bem lembra Rebecca em seu livro, o ataque às Torres Gêmeas em 11 de setembro talvez pudesse ter sido evitado se o governo tivesse escutado os apelos da agente do FBI Coleen Rowley, que havia muito tempo lançava alertas sobre a Al-Qaeda.