Facção criminosa nega fechamento do comércio e reforça que a “vida segue normal” na região de Vila Isabel
Em um comunicado incomum e que chama atenção pelo tom de repúdio, a cúpula da facção criminosa Comando Vermelho (CV) divulgou uma nota oficial nesta semana criticando a cobertura da mídia carioca a respeito da situação no Complexo dos Macacos, localizado em Vila Isabel, na Zona Norte do Rio de Janeiro. A facção acusa veículos de imprensa de disseminarem informações falsas sobre supostas ordens para o fechamento de comércios e tumultos na comunidade.
A nota foi divulgada por canais informais de comunicação e rapidamente se espalhou pelas redes sociais e aplicativos de mensagens. No texto, o grupo criminoso afirma que há uma “nova gestão” atuando na região e nega qualquer interferência na rotina dos moradores e comerciantes locais. Veja a íntegra do comunicado:
“Comunicado a todos os moradores de Vila Isabel e comerciantes ao redor: segue a paz em Vila Isabel. Nova gestão já trazendo a diferença. Não mandamos fechar nada. Morador e vizinho segue a vida normal…”
O conteúdo da nota surpreendeu especialistas em segurança pública por trazer uma tentativa clara de controlar a narrativa sobre a situação do Complexo dos Macacos, tradicional reduto do tráfico de drogas e alvo constante de operações policiais. O uso do termo “nova gestão” sugere uma mudança recente no comando do tráfico local, o que pode indicar disputas internas ou até conflitos com facções rivais.
Tentativa de manter a “paz”?
A mensagem enviada pelo CV tem, segundo analistas, dois principais objetivos: acalmar os ânimos da população e responder ao noticiário que noticiou recentemente a imposição de toques de recolher e ordens de fechamento de estabelecimentos comerciais na área.
“Esse tipo de comunicado tenta transmitir uma ideia de normalidade e até de ‘governo paralelo’ nas comunidades. É uma maneira da facção mostrar força, organização e, ao mesmo tempo, buscar apoio ou ao menos tolerância da população local”, explica o sociólogo e especialista em segurança urbana, Ricardo Henriques.
Moradores relataram, nos últimos dias, a presença de homens armados circulando pela comunidade, além de movimentações atípicas nas entradas do Complexo. No entanto, não houve confirmação oficial de toque de recolher ou fechamento forçado de comércios.
A Polícia Militar afirmou, por meio de nota, que continua monitorando a região e que atua de forma ostensiva e estratégica nas comunidades sob influência do tráfico. “Toda informação recebida é apurada, e as operações seguem com o objetivo de restabelecer a ordem e garantir a segurança da população”, diz o comunicado da corporação.
O papel da mídia
A nota da facção também reacende o debate sobre a responsabilidade da imprensa na cobertura de áreas dominadas por grupos criminosos. Embora a liberdade de imprensa seja essencial, a divulgação de informações não confirmadas pode causar pânico e desinformação.
O episódio evidencia a complexidade da relação entre facções, população, mídia e forças de segurança no cotidiano das favelas cariocas — um cenário onde a disputa por narrativas é quase tão intensa quanto a disputa por território.