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Ao celebrar o pioneirismo da baiana Maria José de Castro Rebello Mendes, que há exatos 100 anos tornou-se a primeira diplomata do país, participantes da Jornada Maria José de Castro Rebello: Um Século de Mulheres Diplomatas no Itamaraty ressaltaram a necessidade de maior protagonismo das mulheres na carreira diplomática. Maria José foi a primeira funcionária pública concursada do Brasil, ao ser aprovada em primeiro lugar no concurso para a entăo Secretaria de Estado das Relaçőes Exteriores.
O evento da Fundaçăo Alexandre de Gusmăo (Funag), vinculada ao Ministério das Relaçőes Exteriores, com o apoio do Grupo de Mulheres Diplomatas, tem por objetivo discutir os desafios que ainda persistem para as mulheres na carreira do serviço exterior, tais como a ascensăo funcional e o assédio moral e sexual.
Apesar de representarem mais da metade da populaçăo brasileira, as mulheres diplomatas correspondem a apenas 23% do total de 1,5 mil integrantes do corpo diplomático. A embaixadora Thereza Maria Quintella destacou o avanço lento da progressăo das diplomatas na carreira ao serem lotadas em setores administrativos e consular, mas năo na área política da pasta. “Porque a área política é que dá visibilidade e poder. O que eles [homens] năo queriam era a possibilidade de dividir poder. Este é um problema até hoje para as diplomatas”.
Segundo ela, em 2003, as mulheres eram 18% dos diplomatas a serviço do Brasil e o ministério contava com oito embaixadoras. Quinze anos depois, o corpo diplomático tem 38 embaixadoras. “O que que eu gostaria de ver é o rosto feminino no acesso ao poder. Nunca houve ministra [das Relaçőes Exteriores] nem secretária-geral”, disse Thereza. “Săo 122 embaixadas: nenhuma embaixadora está lotada no momento na América do Sul, área prioritária para o Brasil. Temos quatro embaixadoras na Europa, cinco na África e três na Ásia”.
A presidente da Associaçăo dos Diplomatas Brasileiros (ADB-Sindical), embaixadora Vitória Cleaver, disse perceber a persistência de dois gargalos para a maior presença da mulher na diplomacia: o baixo número das que se apresentam para o concurso e as dificuldades na ascensăo funcional. “Eu vejo explicaçăo para um percentual baixo de mulheres se apresentando para fazer o concurso porque vejo a carreira ainda com uma imagem que é pouco receptiva às mulheres”.
Os caminhos apontados pela presidente da ADB-Sindical para tornar o ambiente de trabalho mais amigável săo, entre outros, o investimento em creches nas sedes que facilitam a vida da mulher na carreira, além da possibilidade do home office (trabalho de casa) e a adoçăo de horários flexíveis.
“Sobre a questăo da ascensăo funcional, tem que se criar alguns critérios objetivos de mérito para que mulheres e homens sejam avaliados igualmente”, disse Vitória Cleaver. “A carreira ainda é dominada por certos critérios que favorecem a conexăo política e uma certa discricionariedade que, às vezes, prejudica o trabalho da mulher e sua ascensăo para os postos mais altos”.
A embaixadora Gisela Padovan lembrou da campanha #maismulheresdiplomatas lançada em junho pelo ministério para incentivar número cada vez maior de mulheres a participar do Concurso de Admissăo à Carreira de Diplomata (CACD). “Esse é um dos problemas, ter poucas mulheres que se interessam e queiram entrar na carreira”.
Por meio de materiais de comunicaçăo veiculados nas redes sociais da pasta, o Itamaraty espera ampliar a discussăo sobre a carreira diplomática e estimular o ingresso de mulheres.
Gisela Padovan ainda destacou a importância da promoçăo de iniciativas que dêem mais visibilidade para o tema de gênero no Itamaraty que tem, entre suas questőes mais graves, os casos de assédio.
O ministro interino das Relaçőes Exteriores, embaixador Marcos Abbott Galvăo, disse que o Itamaraty recruta seus quadros por concurso público do Instituto Rio Branco desde 1945. “Mas o fato é que as mulheres continuam a representar um universo que năo é correspondente ao peso e a participaçăo que elas têm em várias profissőes de nível superior no Brasil e em outras áreas do serviço público. Isso por circunstâncias que decorrem năo de uma distorçăo imposta mas de uma realidade que interessa ao Brasil e ao Itamaraty que mude”.
Para o embaixador, a própria realizaçăo do seminário demonstra que há, no ministério, uma mobilizaçăo das mulheres para contribuir para a transformaçăo dessa realidade e mostra o caráter democrático do Itamaraty. “O fato da menor presença das mulheres na carreira de diplomata gera sub-representaçăo em certas esferas de chefia e em certos tipos de representaçăo diplomática, áreas em que certamente precisa haver avanços”, afirmou.
O ministro interino informou que a questăo do assédio tem sido combatida “firmemente dentro da lei e onde tem havido avanços no Itamaraty”.
O presidente da Funag, Sérgio Eduardo Moreira Lima, disse que o seminário se insere no marco da Agenda 2030 da ONU para o Desenvolvimento Sustentável que tem entre suas metas a equidade de gênero. “A igualdade de gênero, além de um direito, representa a base para o desenvolvimento sustentável das famílias, para o respeito mútuo e para a construçăo de uma sociedade mais justa”.
Grupo de Mulheres Diplomatas
A conselheira Ana Beatriz Nogueira, representante do Grupo de Mulheres Diplomatas, conta que o coletivo surgiu em 2013, no contexto das manifestaçőes sociais e do movimento de mulheres no país. A articulaçăo é feita por meio de plataformas digitais já que muitas estăo servindo em postos no exterior. “Conseguimos algumas vitórias. O seminário hoje é uma delas. Em 2014, a pedido do Grupo de Mulheres, foi criado o Comitê Gestor de Gênero e Raça [órgăo de caráter permanente e consultivo]”.
O grupo no Facebook tem 216 integrantes de um total de 360 mulheres diplomatas. “O Grupo de Mulheres tem conseguido manter o tema da igualdade de gênero à tona numa instituiçăo tăo masculina como o Itamaraty”, disse a conselheira.
Uma das mobilizaçőes do grupo com maior repercussăo foi a vaquinha virtual para custear o tratamento de uma ex-namorada do primeiro-secretário Renato de Ávila Viana, demitido no último dia 20. Ela perdeu um dos dentes após ser agredida pelo diplomata.
“A ideia foi mostrar solidariedade a uma colega. Somos todas mulheres dentro de uma sociedade machista”, disse Ana Beatriz. “A sociedade está madura para discutir a questăo da violência, a presença das mulheres em espaços de poder”.
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Fonte: Brasil