O ministro da Segurança Pública, Raul Jungmann, anunciou nesta quinta-feira (1º) que a Polícia Federal (PF) vai investigar a existência de um grupo criminoso articulado para atrapalhar e impedir as investigaçőes do assassinato da vereadora Marielle Franco (PSOL) e de seu motorista, Anderson Gomes, em março. O ministro solicitou a instauraçăo de inquérito policial para apurar o envolvimento de agentes públicos, milicianos e contraventores que estariam atuando em conjunto.
O pedido de atuaçăo da PF foi feito no mesmo dia pela procuradora-geral da República, Raquel Dodge, com base em depoimentos de duas pessoas que estariam ligadas ao crime. “As denúncias săo extremamente graves, precisam ser investigadas”, afirmou Jungmann. O ministro, no entanto, năo quis dar informaçőes sobre quem seriam essas pessoas e qual o grau de confiabilidade dos testemunhos. Ele disse apenas que os depoimentos foram dados há um mês a procuradores federais.
Reportagem do jornal O Globo desta quinta-feira mostra que um dos depoimentos foi dado pelo ex-policial militar Orlando de Oliveira Araújo, o Orlando de Curicica. Ele está preso na Penitenciária Federal de Mossoró (RN). Em entrevista concedida por escrito ao jornal, Curicica negou ter participado do duplo assassinato, mas afirmou que a Polícia Civil do Rio năo tem interesse em elucidar o caso e que haveria pagamento de dinheiro a agentes públicos.
Ele acusou até o chefe do órgăo, o delegado Rivaldo Barbosa, de ter montado uma intrincada rede de proteçăo aos chefes da contravençăo envolvidos em assassinatos. De acordo com O Globo, a informaçăo consta do depoimento de Curicica dado à PGR. Segundo apurou o Broadcast/Estadăo, o segundo depoimento também foi tomado pelo Ministério Público em um presídio do Rio Grande do Norte.
Năo há previsăo de federalizaçăo da investigaçăo da morte de Marielle e Anderson. O caso continuará com a Polícia Civil, com a ajuda do Ministério Público Estadual do Rio. Por considerar graves as informaçőes dos depoimentos, Raquel Dodge pediu que a PF garanta segurança aos depoentes e a seus familiares.
Em agosto, Jungmann chegou a oferecer publicamente ajuda da Polícia Federal, mas autoridades do Rio a cargo da investigaçăo recusaram. O ministro esclareceu que o novo inquérito pode, eventualmente, vir a ajudar a elucidar os assassinatos, mas destacou que as duas investigaçőes têm objetivos diferentes.
“O que se está fazendo é criar um outro eixo que investigará aqueles ou aquelas que estejam dentro da máquina pública – portanto, agentes públicos -, ligados ao crime organizado ou a interesses políticos e que estăo tentando impedir que seja elucidado esse crime. Entăo, em certo sentido, năo deixa de ser uma investigaçăo da investigaçăo que está sendo feita”, disse.
Questionado se os depoimentos foram acompanhados de provas materiais, o ministro afirmou que năo poderia dar detalhes porque o caso está sob sigilo. “Săo depoimentos em vídeo devidamente gravados por procuradores da República com fatos, nomes e valores que têm de ser devidamente investigados. Pode ser que năo seja isso, mas também evidentemente pode ser que tenha fundamento.”
O chefe da Polícia Civil, delegado Rivaldo Barbosa, afirmou por meio de nota oficial que a investigaçăo do caso Marielle está muito próxima do fim. Disse ainda que “repudia a tentativa de um miliciano altamente perigoso, que responde a 12 homicídios, de colocar em risco uma investigaçăo que está sendo conduzida com dedicaçăo e seriedade”. “Ao acusado (Curicica) foram dadas amplas oportunidades pela Polícia Civil para que pudesse colaborar com as investigaçőes de duplo homicídio dentro do estrito cumprimento da lei.”
Curicica estava preso no Complexo Penitenciário de Gericinó, no Rio, mas, depois da morte da vereadora, foi transferido para a penitenciária federal. Na ocasiăo, por meio de seu advogado, ele contou que estava sendo pressionado pela polícia para confessar participaçăo no crime e, como havia se negado a assumir a culpa, teria sido transferido.
“Năo causaram surpresa as ilaçőes feitas pelo preso, tendo em vista que, historicamente, chefes de organizaçăo criminosa, notadamente milícias, se utilizam desse artifício para desmoralizar e desacreditar instituiçőes idôneas e seus membros”, continua a nota oficial. “Nenhum esforço está sendo poupado, cabendo ressaltar que todas as técnicas e os recursos disponíveis têm sido empregados no trabalho de investigaçăo. Dentro desse propósito, o chefe de Polícia Civil garante: o caso está muito próximo de sua elucidaçăo.”