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Carioca, o general Richard Nunes está desde fevereiro à frente da Secretaria de Segurança do Rio de Janeiro. Nesta entrevista, ele revela que vive 24 horas e sete dias por semana os problemas da segurança do estado. Durante pouco mais de uma hora, o general conversou com a equipe de reportagem da Agência Brasil e năo descartou a possibilidade de concluir o ano sem a elucidaçăo do duplo assassinato da vereadora Marielle Franco (PSOL-RJ) e de seu motorista, Anderson Gomes. “Eu sempre falei com essa cautela. Eu nunca fiquei dizendo negócio de data. Existe a possibilidade de fechar? Existe. E existe a possibilidade de a gente ter um pouco mais de dificuldade e levar um pouco mais de tempo.”
Marielle Franco e Anderson foram assassinados a tiros, em 14 de março deste ano, após um evento político no centro do Rio de Janeiro. O crime causou comoçăo internacional. O papa Francisco se manifestou sobre o episódio ao apelar por providências. Mais de uma vez, houve a discussăo da transferência do comando das investigaçőes, sob tutela da Polícia Civil do Rio, para a Polícia Federal.
Richard Nunes, entretanto, se demonstra prudência na soluçăo do duplo assassinato, esbanja firmeza quando fala do legado que deixará em 31 de dezembro. O principal é a retomada do orgulho e da credibilidade das polícias Civil e Militar. E também o fortalecimento das corporaçőes, com a efetivaçăo de novos policiais como oficiais de cartório, praças, papiloscopista e um concurso para delegados.
O chefe da Segurança no estado disse também que está tudo pronto para as eleiçőes de outubro. Haverá um gabinete de crise, nos moldes do implementado durante a paralisaçăo dos caminhoneiros, em maio, mas desta vez, sem crise. Serăo empregados 20 mil militares. No Rio, muitos candidatos săo investigados por associaçăo com traficantes e milicianos.
O general está otimista quanto aos números do Instituto de Segurança Pública (ISP) em relaçăo a este mês de setembro. Segundo ele, as prévias mostram “que todos os índices devem baixar”, inclusive os de homicídios por confrontos no estado, que em agosto, subiram mais de 150%.
Homicídios em confronto com policiais
“Foi o único índice que destoou. Estamos fazendo duas grandes manobras. E é um paradigma daquilo que a gente vinha tolerando. O estado estava quebrado. Năo tinha recursos. O policiamento caiu muito, e o criminoso é um ser adaptável ao ambiente. Agora vamos atuar em cima das manchas criminais e aí nós estamos nos defrontando com aqueles criminosos que estavam tendo uma certa liberdade. E eles têm sido resistentes a se adaptar a um novo cenário. O suporte logístico da atividade criminosa foi muito afetado. Na realidade, a gente quebrou a autonomia dessas facçőes. Em nenhum momento nós temos política de enfrentamento”.
Unidades de Polícia Pacificadoras (UPPs)
“É preciso redesenhar o patrulhamento. E isso tem dado problema. Vamos falar o português claro: a gente fingia que tinha polícia e a sociedade acreditava. Certas UPPs nossas năo passam de uma coletânea de bases. O policial tem de tomar conta daquela instalaçăo e é incapaz de patrulhar aquela área. No momento em que a gente transforma a UPP em companhia de batalhăo, passa a ter patrulhamento. Passa a dar mobilidade. E aquelas UPPs de áreas restritas em que é possível manter, nós vamos manter. A Providência vai continuar. Santa Marta vai continuar. A Rocinha a gente está estudando, mas é difícil imaginar que a gente possa ter uma UPP numa área tăo grande. A soluçăo definitiva para a Rocinha ainda năo está definida. Na Cidade de Deus e Vila Kennedy, também năo dá. É complicado”.
Delegacias de polícia
“Isso está sendo resolvido agora com o Fundo Estadual de Investimentos e Açőes de Segurança Pública e Desenvolvimento Social (Fised)). É aquele fundo de 5% dos royalties do petróleo. Ele só vai sair pelo esforço da intervençăo. Até para reunir o conselho foi uma luta. A primeira parcela, de R$ 92 milhőes, já está em execuçăo. A segunda parcela, de R$ 103 milhőes, nós vamos bater o martelo no dia 3 de outubro. A terceira parcela depende da arrecadaçăo até o final do ano, só vai entrar praticamente em janeiro. Se considerarmos uns R$ 300 milhőes de royalties, para a segurança pública săo uns R$ 225 milhőes. É bastante dinheiro. Este ano a gente está amortizando muito coisa. Quem entrar no próximo ano já vai pegar uma situaçăo muito mais estabilizada”.
Combate à criminalidade
“Aquela prisăo em Japeri foi um divisor de águas. Nós identificamos um prefeito ligado ao narcotráfico, o presidente da Câmara de Vereadores e mais um vereador. Essa quadrilha foi toda presa. Prender um prefeito, com toda sua estrutura de mando, sinaliza para o estado que os ventos estăo mudando”.
Legado da intervençăo
“O principal é um exercício eficaz de liderança. Hoje, estive numa cerimônia no Batalhăo de Choque. O comandante do Batalhăo de Choque, ao me cumprimentar, disse: ‘General eu queria te dizer uma coisa. Muitos destes aqui săo pais e eles estăo resgatando o orgulho e dizendo para os filhos que săo policiais’. Isso é um legado que, para mim, é o mais importante de todos – a retomada da autoestima e de querer ter a credibilidade perdida”.
Esquema de segurança nas eleiçőes
“Vamos atuar de maneira integrada à semelhança do que fizemos na greve dos caminhoneiros. Vamos instalar um gabinete de crise, năo que haja uma crise. Com todos os órgăos envolvidos. Já temos o trabalho de inteligência integrada funcionando faz tempo. Temos um levantamento completo das áreas de risco. Onde nós vamos empregar as Forças Armadas. Onde a PM [Polícia Militar] vai se encarregar. Apoio da Guarda Municipal. Em que pontos a Polícia Rodoviária Federal vai ser importante. E a coalizăo com o TRE [Tribunal Regional Eleitoral] já está funcionando há vários meses. O efetivo de 20 mil militares que está aqui. Do Exército, da Marinha e da Aeronáutica. A gente vai para áreas onde o histórico mostra mais problemas: Săo Gonçalo, Baixada Fluminense”.
Transiçăo para o novo governo
“Nós já temos um plano preparatório para a transiçăo, assinado entre o general Braga Netto e o governador Pezăo, que sinaliza secretarias e tudo o que tem de ser feito. No momento em que nós tivermos o governador eleito aí este plano, que é provisório, vai ter de ser consolidado. A parte administrativa, necessariamente, tem de ir até 30 de junho do ano que vem. Porque estamos comprando coisas e contratos estăo sendo celebrados. É dinheiro federal. Năo temos como passar isso para o estado, ainda mais um estado em recuperaçăo fiscal. Um quarto do efetivo vai poder tocar. É que claro que o governador eleito vai ter a sua vontade política, mas se tiver o mínimo de bom senso nesta transiçăo, vai pegar o nosso plano, trocar o seis por meia dúzia e botar adiante”.
Índices devem baixar
Todos os índices devem baixar, inclusive o confronto. Se continuar do jeito que está aí, a gente vai ter uma reduçăo bastante boa em relaçăo a agosto (deste ano) e a setembro do ano passado. O indicativo está muito bom. Aquele 150% foram uma distorçăo. O problema da estatística é que ela pode ser usada para qualquer coisa. O observatório da Cândido Mendes está com a lente quebrada. Eu afirmo. Eles só estăo focados em uma visăo e conseguem abstrair todo o mais, que é muito mais consistente. É impressionante. Estes 150% săo um ponto fora da curva até porque, no ano passado, naquele momento năo havia nem policiamento. Por isso que estava tudo estourando. A criminalidade atingiu níveis dramáticos porque a policia năo tinha viatura, năo tinha salário. O regime adicional de serviço, que a gente resgatou, é fundamental.
Homicídios em confrontos
“Foi porque a gente começou a operar com ostensividade. Agora, a coisa começa a se acomodar um pouco mais. A nossa expectativa é esta. Ninguém aqui quer o enfrentamento. Desde o início nós achamos. O enfrentamento pelo enfrentamento é uma bobagem. Às vezes, ele se produz de maneira legítima e necessária. Lógico, vamos fazer uma açăo numa área, que a gente sabe, que temos dados concretos, investigaçăo, que tem um grupo criminoso, armado e ameaçando as pessoas…nós vamos nos omitir? Determinados noticiários ficam buscando o flagrante da criminalidade. O radar deles fica ali atrás. Localizado um ato criminoso, fica uma cobrança. “ E aí? Năo văo fazer nada?”. A gente năo pode se pautar por isso. Se chegar lá simplesmente para dar uma resposta midiática, aí sim dá um risco colateral muito grande”.
Rio de Janeiro em 2019
“Vamos entregar [o estado] em situaçăo muito melhor do que encontramos porque tudo que fizemos até agora, em termos estruturantes, teve uma repercussăo favorável. O mais importante é que as próprias instituiçőes se deram conta de que isso era relevante. Elas se apropriaram do plano. Isso é que é bom. Entăo, qualquer que seja o cenário, eu acredito que a gente fez uma ruptura de tendência importantíssima”.
Prisăo dos assassinos de Marielle e Anderson
“Tenho a expectativa. Nós temos feito o máximo de esforço possível. As coisas têm caminhado. Agora estamos mais fortalecidos porque o Ministério Público [MP] se vinculou fortemente à investigaçăo com o Gaeco [Grupo de Atuaçăo Especial de Combate ao Crime Organizado]. Entăo, isso nos dá um ânimo muito grande. Eu conversei com o nosso procurador-geral de Justiça sobre isso e ele colocou o MP junto conosco. Eles entraram, fizeram uma avaliaçăo da investigaçăo e perceberam que a gente está no caminho certo. Mas qual é grande problema do caso? A deficiência estrutural que ainda temos em várias áreas, principalmente essa questăo de câmeras pela cidade, săo câmeras da prefeitura, isso nos atrapalhou muito, porque há crimes que estamos elucidando com muito mais facilidade porque esses sistemas estăo funcionando bem. A grande dificuldade hoje é coletar e produzir as provas necessárias para que os nossos suspeitos possam ser efetivamente condenados no futuro. E năo irresponsavelmente dar por concluído o inquérito com provas frágeis e, no final, isso năo resultar em nada. Vai ser muito pior para a sociedade. A gente entende o clamor da sociedade. O clamor da família. Eles têm confiança de que a gente está fazendo a coisa certa. E a nossa expectativa é de elucidar. Agora, para termos sucesso pleno na investigaçăo ainda faltam detalhes técnicos. Isso é que năo é simples. A investigaçăo está sendo custosa porque, realmente, foi um crime elaborado com cuidado para evitar a investigaçăo. Eles conseguiram criar grande dificuldade pela maneira como praticaram esse crime.
Eu sempre falei com essa cautela. Eu nunca fiquei dizendo negócio de data. Existe a possibilidade de fechar? Existe. E existe a possibilidade de a gente ter um pouco mais de dificuldade e levar um pouco mais de tempo. Ambas existem”.
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Fonte: Brasil