O Vulcão Juliana
Por Dr Marcelo Tinoco
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Juliana Marins era feita de sol. Tinha o tipo de beleza que não cabia apenas no rosto — irradiava dos gestos, do sorriso espontâneo, da fala cheia de entusiasmo. Jovem, aventureira, dona de uma alma que nunca quis viver pouco, Juliana foi dessas pessoas raras que escolhem os caminhos mais difíceis não por desafio, mas por amor à vida. Amor que se expressava em cada viagem, cada montanha escalada, cada passo em direção ao desconhecido.
Foi esse amor que a levou à Indonésia, ao majestoso Monte Rinjani — e foi ali, na borda da cratera de um vulcão ativo, que Juliana caiu. Mas não morreu de imediato. Lutou por quatro dias. Quatro dias contra a fome. Contra a sede. Contra o frio que a mordia nos ossos e o medo que tentava sufocar seu espírito livre. E sobretudo, contra a solidão — a pior das dores. A mais cruel.
Em algum momento, ela deve ter gritado — em voz ou em pensamento — o mesmo clamor do Gólgota: “Eli, Eli, lama sabactani?” Meu Deus, por que me abandonaste? Porque o resgate não veio a tempo. Porque o mundo que ela amava tanto, naquele instante, pareceu calar diante do seu sofrimento.
Ela não estava sozinha. Estava com um guia, Ali Musthofa. Um homem que, diante do cansaço dela, escolheu seguir adiante e foi ali que ele também se perdeu. Abandonou Juliana na trilha como quem deixa uma mochila — quando na verdade, deixava para trás um universo inteiro de luz e vontade de viver. Não foi apenas um erro técnico, foi uma gigantesca falha moral. Um guia, ali naquelas condições, devia ter agido como um bom militar: aquele que sabe que ninguém, ninguém, NINGUÉM SOB SEU COMANDO JAMAIS DEVE FICAR E JAMAIS FICARÁ PARA TRÁS. Nem a pessoa mais frágil. Nem a mais exausta. Porque é justamente aí que começa a verdadeira força e o altruísmo — em não desistir do outro. Eu sei, eu sei que parece julgamento, mas os relatos falam que ela cansou… ele vacilou, foi culposo, não foi doloso. Agora é outra vítima que precisará lidar com esse fantasma na mente e espero encontre paz, a paz pela qual lutou ao tentar o resgate da menina, ou quiçá o autoresgate…
A morte de Juliana não foi apenas sua. Foi também a morte de pedaços generosos das almas de milhões de pessoas, de toda nacionalidade, raça e religião, que sonham, que caminham, que acreditam no valor de cada vida. Porque Juliana era a filha que poderia ser nossa, a amiga, a irmã, a mulher que representava o que temos de melhor: a vontade de viver intensamente e a esperança de não morrer sozinha.
Batizei o Monte Rinjani de Vulcão Juliana. Que sua memória queime como lava em nossos corações — não para destruir, mas para acender em nós a chama do cuidado, da responsabilidade e da empatia. Que cada passo que dermos em montanhas, trilhas e jornadas, carregue o peso e a beleza de sua história. E que jamais, jamais, deixemos alguém para trás.