Domingo. Chegaram todos da Igreja. A matriarca da família senta na tal da “cadeira da vovó”. Ela já
sabe que não pode abusar do bacalhau mas fica indignada com o que soube esse ano:
– Não fui eu que fiz, mãe!
– Onde já se viu isso, hein? Não fazer o almoço…
– Ah, mãe, encomendei com a Dona Neide. É a filha dela que faz, a Luciene.
– Nunca mais! Quer me matar da pressão, menina?
Termina o almoço raspando o prato e chama o menino sentado ao seu lado:
– Luiz, faz um favor pra vovó adoçar a boca, filho. Pega uma colherinha do manjar…
– Mas vó, a minha mãe disse que…
– Pega lá pra sua vó, sou eu que tô mandando você ir.
O menino volta com a vasilha de vidro e uma colher de sobremesa. O manjar derrete na boca, lógico.
É a receita dela, passada religiosamente para a filha, sem poupar os ingredientes. E agora? O genro
palita os dentes e conversa com os agregados.
Os assuntos na mesa são os mais úteis do mundo: a plástica da prima de segundo grau do sobrinho,
a irmã da vizinha de frente que está estudando no exterior e prometeu trazer perfume, o primo da
madrinha que foi preso mas já foi solto e tá aprontando de novo. E, quando o assunto chega ao fim,
sempre alguém solta um:
– Ah, se fosse no meu tempo!
A mãe recolhe a mesa, vai lavar a louça; As crianças vão para o canto da sala mexer no celular; O
resto acaba caindo em algum canto para tirar o sono da tarde. A esta altura, a matriarca já havia
dormido na cadeira por pelo menos quinze minutos. E ninguém a incomoda, claro.
E a tarde vai chegando, o sol entra pela janela e todas as casas do subúrbio contam suas mesmas
histórias.
Escrito por: Ana Paula Bellot