A Agência Nacional de Águas (ANA) divulgou ontem um dado alarmante: cresce no país a quantidade de barragens com risco de se romper — como aconteceu há três anos no município mineiro de Mariana, quando o colapso da barragem do Fundăo, da mineradora Samarco, deixou um rastro de lama que soterrou vilas e provocou a morte de 19 pessoas. Em 2017, segundo relatório divulgado ontem pela autarquia, havia 45 estruturas em perigo, número 80% maior que o registrado em 2016, quando 25 apresentavam riscos. Recuperá-las custaria R$ 92,2 milhőes, segundo projeçăo da agência.
O relatório mostra que as principais falhas săo baixo nível de conservaçăo, insuficiência do vertedor e falta de documentos que comprovem a estabilidade das estruturas. A maioria das barragens com problemas está localizada no Norte e no Nordeste, em estados como Acre, Alagoas e Bahia. Das 45 em situaçăo de risco, 25 pertencem a órgăos ou entidades públicas. No período analisado pelo relatório, a ANA identificou 14 acidentes e incidentes, sem mortes.
Os riscos podem ser ainda maiores, já que somente 17% das barragens săo vistoriadas anualmente. “O monitoramento deve basear-se em critérios como nível de perigo, categoria de risco, dano potencial associado e disposiçăo do empreendedor em colaborar, pois năo há condiçőes de os fiscais visitarem todo seu universo de barragens todo ano”, diz o documento.
De acordo com o relatório, existem problemas de todos os tipos, sendo os mais frequentes a ausência de documentaçăo, estruturas comprometidas e parcialmente inoperantes, surgências e infiltraçőes, embargos jurídicos e até o encerramento das atividades da empresa responsável sem a implantaçăo de programa de desativaçăo das barragens.
O temor de técnicos é de que uma tragédia como a de Mariana se repita. Além de provocar mortes, o maior desastre ambiental da história do país devastou dois municípios. Várias famílias atingidas pelo desastre continuam sem receber indenizaçăo ou auxílio (leia Memória).
Uma das principais dificuldades de fiscalizaçăo é o deslocamento para a visitaçăo das barragens. Somente 20 órgăos fiscalizadores, de um total de 31, realizaram alguma vistoria in loco. “A rotina de fiscalizaçăo ainda deve ser introduzida em cerca de um terço dos órgăos fiscalizadores”, avalia a ANA.
No país há um cadastro que reúne 24.092 barragens para diferentes finalidades, como acúmulo de água, de rejeitos de minérios ou industriais, e para geraçăo de energia. O Departamento Nacional de Obras Contra as Secas (Dnocs) e a mineradora Vale do Rio do Doce têm o maior número de barragens cadastradas, com 253 e 175, respectivamente.
MemóriaVítimas da lama
O rompimento da barragem do Fundăo, no distrito de Bento Ribeiro, em Mariana (MG), em 5 de novembro de 2015, liberou um mar de lama de rejeitos de minérios que atingiu mais de 40 cidades, matou 19 pessoas e impactou a fauna e a flora do Rio Doce por 660km entre Minas Gerais e Espírito Santo. Segundo perícia da Polícia Civil, havia uma grande quantidade de água no depósito, além da lama, o que tornou a drenagem insuficiente e gerou o rompimento. A estrutura pertence à mineradora Samarco, de propriedade da Vale e da empresa australiana BHP Billiton. A Fundaçăo Renova, criada a partir de um acordo entre a Samarco, a Uniăo e os estados prejudicados, afirma que foram pagos cerca de R$ 1,1 bilhăo em indenizaçőes e auxílios financeiros a vítimas da tragédia.