Nesta sexta-feira, Eduarda Oliveira, de 27 anos, estava de folga do trabalho. O prazer de passar o dia inteiro em família deu lugar ao pânico. Mãe do pequeno Luis Miguel Oliveira, de sete anos, baleado dentro de casa, nesta sexta-feira na comunidade do Bateau Mouche, na Praça Seca, na Zona Oeste do Rio, ela relatou os momentos de pânico vividos pela família, desde que os tiros entre milicianos e traficantes começaram nesta tarde.
Eduarda colocou um colchão na sala da residência para que os três filhos ficassem abaixados no chão do cômodo. Quando ela saiu do local, Luis Miguel levantou pedindo por um copo d’água. Foi quando diversos disparos atingiram a residência e um deles acertou o menino no ombro.
Com o tiroteio intenso e sem tréguas, Eduarda e a família não conseguiram deixar a comunidade. O socorro ao menino só foi possível cerca de 30 minutos depois.
— Quando eu levantei, ele veio atrás de mim e me pediu água. Ouvi uma explosão, me joguei em cima dele e senti o sangue quente dele em mim. Comecei a gritar e pedir socorro, Meu tio, que estava comigo, pegou ele no colo e desceu correndo. Minha mãe deu um banho nele, lavou o ferimento e colocou um curativo para parar de sangrar. Demorou meia hora para eu conseguir sair com ele daqui e correr para o hospital. Ele demorou a sentir dor. Estava mais nervoso porque eu estava desesperada. O meu filho menor estava com o mais velho. Foi desesperador — disse.
A primeira parada foi na Unidade de Pronto Atendimento da região. No local, Luis Miguel passou pelos primeiros exames e foi encaminhado para o Hospital Municipal Salgado Filho, no Méier, na Zona Norte. Ele ficou com a bala alojada no ombro e precisará esperar a cicatrização do ferimento para retirar o projétil. Segundo Eduarda, o tiro que atingiu Luis Miguel atingiu a parede e depois o menino. Para os médicos, ele teve sorte.
— Vamos ter que esperar cicatrizar para fazer a cirurgia. Me disseram que deve levar mais ou menos dois meses. O médico disse que ele teve sorte e que eu tinha que agradecer a Deus porque a pressão da bala foi na parede e não nele. Se a bala tivesse batido totalmente no meu filho, ele não estaria mais vivo — falou.
A casa da família foi atingida por, pelo menos, três tiros. Dois acertaram a cozinha e um deles acertou a caixa d’água, alagando a residência. Eduarda, que é moradora da comunidade há dez anos, disse nunca ter passado por algo do tipo na região.
— Nunca passei por nada parecido. Eu trabalho, sempre falo para eles ficarem dentro de casa para ficarem guardados. Mas nem dentro de casa mais eles estão guardados. Vontade de ir embora a gente tem. Mas cadê a condição? Ficamos com medo, mas não temos o que fazer — lamentou.
O pequeno Luis Miguel recebeu alta ainda nesta sexta-feira e já está em casa com a família. Ele está medicado e terá acompanhamento médico para realização da cirurgia de retirada do projétil que o atingiu.
Em três dias, três crianças e dois adolescentes são baleados no Rio
Luis Miguel foi quinto menor atingido por disparo de arma de fogo nesta semana no Rio. Na noite de quarta-feira, o menino João Pedro Soares da Costa, de 4 anos, foi baleado nas costas quando estava a caminho da igreja com o pai. Segundo a polícia, os tiros partiram de criminosos da própria comunidade. Eles teriam se assustado quando viram um carro estranho entrando na favela e dispararam em direção ao veículo, mas acabaram atingindo o garoto, que andava ao lado do pai, na rua. Muito abalados, amigos e familiares de João não quiseram conversar com a imprensa.
O menino foi socorrido pelos próprios familiares e levado para o Hospital Estadual Alberto Torres, no Colubandê, onde permanece em estado grave.
Na madrugada de terça-feira, Emilly Sofia, de 3 anos, havia acabado de sair de uma lanchonete com os pais, em Anchieta, na Zona Norte do Rio, quando disparos de fuzil feitos por criminosos que queriam roubar o veículo atravessaram a lataria. O casal e a menina foram baleados. Emilly não resistiu.
Na tarde do mesmo dia, menos de 12 horas depois, Jeremias, de 13, jogava bola na rua, no Complexo da Maré, também na Zona Norte, quando foi morto com um tiro no peito. Um caveirão da PM, que havia entrado no local em busca de homens que teriam sido sequestrados por traficantes, foi recebido a tiros. O menino foi atingido no peito e não chegou vivo ao hospital.
Nesta sexta-feira, em Jacarepaguá, uma adolescente de 15 anos foi encontrada baleada com um tiro na cabeça próximo ao quartel dos Bombeiros do Tanque. Evelyn da Silva Coelho e foi encaminhada para o Hospital Municipal Miguel Couto, na Gávea. O estado de saúde dela é grave.
Confrontos entre traficantes e milicianos assustam moradores há uma semana, na Praça Seca
Moradores da comunidade Bateau Mouche, na Praça Seca, na Zona Oeste do Rio, relatam novos confrontos na manhã desta sexta-feira. Há uma semana, a região tem enfrentado tiroteios na disputa entre milicianos e traficantes pelo controle do território. Nesta sexta, segundo o comando do 18ºBPM (Jacarepaguá), o batalhão foi acionado devido a disparos de arma de fogo na comunidade e policiais militares foram deslocados para a região.